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MEDIDAS DE APOIO PARA CUMPRIMENTO DE SENTENÇA EM OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER - 27/03/2018

1 INTRODUÇÃO
 
O princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional, previsto no artigo 5°, inciso XXXV, da CRFB, não prevê somente o acesso formal aos órgãos do Poder Judiciário, mas sim o acesso à justiça que propicie a efetiva e tempestiva proteção do direito das partes, de forma a viabilizar o acesso a uma ordem jurídica verdadeiramente justa.  
 
Com efeito, o Poder Judiciário que não desempenha suas funções em tempo razoável e de modo efetivo acaba se tornando um poder inacessível, inútil e injusto. 
 
Damasceno , quanto a este ponto, informa o seguinte:
 
"Um estudo recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado na revista Veja (Veja, São Paulo, edição 1881, 24 de novembro de 2004, Alexandre Oltramari), constatou que a insegurança provocada pela morosidade do judiciário atrapalha fortemente o crescimento do país. Segundo tal estudo, calcula-se que o Brasil deixe de produzir cinco bilhões de dólares em riquezas, o equivalente a 1% do PIB, apenas em razão da desconfiança dos investidores internacionais sobre o funcionamento do Judiciário. Explica-se. Nos Estados Unidos, uma disputa judicial dura em média quatro meses até ser julgada. No Brasil o tempo médio de duração de um processo judicial é de doze anos. Existem, vergonhosamente, processos que tramitam há meio século na Justiça e, muitas vezes, a decisão final só ocorre quando o autor já está morto. Não é apenas na economia do país que a lentidão da justiça gera graves prejuízos, ela repercute direta e indiretamente na vida de todos os cidadãos. Gera prejuízos, insegurança, enriquecimento sem causa e um grande descrédito. Um judiciário que não oferece a confiança e previsibilidade de sua eficiência a seus jurisdicionados, não oferece também a necessária segurança jurídica."
 
Assim é que a sua eficiência ou ineficácia do Poder Judiciário reflete em diversos outros setores, inclusive na economia, causando desconfiança de investidores nacionais e estrangeiros a lentidão da tramitação dos processos judiciais. 
 
O termo eficiência e efetividade devem ser entendidos principalmente como a concretização da justiça por meio do exercício do direito subjetivo ameaçado ou violado pela conduta ilegítima de outrem. 
 
E o exercício desse direito, dentro do processo civil, concretiza-se por meio da execução forçada, que sofreu diversas alterações legislativas dos últimos tempos. 
 
Com efeito, desde o advento da lei 13.105, de 16.03.2015, o novo Código de Processo Civil, a fim de que o procedimento processual possa tornar-se um procedimento célere, justo e efetivo. 
 
Algumas dessas alterações já haviam ocorrido no Código de Processo Civil de 1973, precisamente nos artigos 461 e 461-A, pelas leis n. 8.952/94 e 10.444/02, dos quais foram mantidos no Novo Código de Processo Civil, através dos artigos 497 e 498, que determinaram a concessão da tutela especifica, nas obrigações de fazer, não fazer e dar coisa diferente de dinheiro, devendo o juiz determinar providencias que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento, tais como a utilização da tutela de urgência e de medidas de coerção e apoio, como a multa, a busca e apreensão, a remoção de coisas e pessoas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade. 
 
Isso significa que a execução para as obrigações de fazer e não fazer não mais depende de ação autônoma, podendo ser implementada em um processo sincrético, no qual há a certificação do direito e a sua execução, com a utilização de medidas de apoio e coercitivas para a satisfação do direito do credor.
 
E o objetivo do presente trabalho é examinar as medidas de coerção e de apoio que podem ser utilizadas pelo juízo nessas novas formas de execução, como forma de se alcançar a tutela específica ou um resultado prático equivalente. 
 
E a principal delas, sem dúvida alguma, é a multa coercitiva, que será bastante estudada no presente trabalho, imposta ao devedor da obrigação, ao contar da data do descumprimento da ordem judicial, visando a, por meio do coerção psicológica, contribuir para a celerização, justeza e eficácia do processo jurisdicional. 
 
Nem breve histórico, antes da modificações introduzidas pelas leis n. 8.952/94 e 10.444/02, a execução das obrigações de fazer e não fazer dependiam do ajuizamento de ação autônoma, o que tornava muito difícil a satisfação do direito do vencedor da demanda, principalmente “pela demora, pela falta de funcionalidade e pela elevação dos custos.” 
 
Além do que, inspirado pelos ideais liberais de que a liberdade humana é o valor maior, o CPC entendia que a resolução em perdas e danos era a única consequência possível para descumprimento das obrigações de fazer e não fazer. O devedor tinha uma espécie de direito de não cumprir o próprio dever, desde que pagasse por isso.  
 
Isso decorre do fato de que, conforme esposado por Didier Jr.,  é antiga a confusão entre ato ilícito e dano, gerando como consequência a ótica de que a violação de um dever jurídico que não causasse dano não poderia ser considerada um ato ilícito. 
 
Prossegue o professor Didier Jr.  aduzindo o seguinte:
 
"A necessidade de mais bem prestar a tutela jurisdicional (presta-la de forma mais adequada) fez com que se isolassem as tutelas dirigidas contra o ilícito das tutelas dirigidas contra o dano [...]. Dessa forma, poder-se-ia prestar ao jurisdicionado uma tutela mais efetiva, que garantisse a entrega do bem da vida pretendido, e não a sua substituição pelo equivalente em pecúnia. Assim, não mais se exigiu dele que aguardasse pela superveniência do dano para que pudesse agir em juízo: a só existência do ilícito ou a sua iminência já seria suficiente para que o interessado pudesse deflagrar a atividade jurisdicional."
 
Conclui o referido autor nos seguintes termos: 
 
"É com base na distinção entre ilícito e dano, e com os olhos postos na tutela jurisdicional que pode ser utilizada contra cada um deles, que se promove a divisão da tutela especifica em inibitória, reintegratória e ressarcitória."
 
O art. 12 do Código Civil de 2002 , encartado no capítulo que trata dos direitos da personalidade, é bastante didático em sua redação e dá uma boa visão das três espécies de tutela jurisdicional especifica de que ora se fala: ao referir-se à “ameaça”, prevê a possibilidade do manejo da tutela inibitória para evitar a prática do ilícito já consumado; e ao referir-se às “perdas e danos”, faz clara menção à tutela ressarcitória, que visa à busca da reparação pelo dano eventualmente decorrente do ilícito praticado. 
 
Assim é que, atualmente, não mais é necessária a ocorrência de dano para que possa ingressar em juízo e pleitear o pagamento de indenização; a simples ameaça ou prática efetiva de ato ilícito, ainda que não cause dano, já autoriza o lesado a ingressar em juízo para impedir a concretização da ameaça ou pedir a cessação da atividade. 
 
Do artigo 497, 498, 499, 500, 536 ao 537, do CPC, que trata sobre as obrigações de fazer e não fazer (tutela inibitória e de remoção do ilícito), encontra-se redigido da seguinte forma:
 
"Art. 497.  Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.
 
Parágrafo único.  Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo.
 
Art. 499.  A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.
 
Art. 500.  A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa fixada periodicamente para compelir o réu ao cumprimento específico da obrigação.
 
Art. 536.  No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.
 
§ 1o Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.
 
§ 2o O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 (dois) oficiais de justiça, observando-se o disposto no art. 846, §§ 1o a 4o, se houver necessidade de arrombamento.
 
§ 3o O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificadamente descumprir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de desobediência.
 
§ 4o No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, aplica-se o art. 525, no que couber.
 
§ 5o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.
 
Art. 537.  A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.
 
§ 1o O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que:
 
I - se tornou insuficiente ou excessiva;
 
II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.
 
§ 2o O valor da multa será devido ao exequente.
 
§ 3º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte.
 
§ 4o A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado.
 
§ 5o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional."
 
Didier Jr.  lembra o seguinte, com relação a esse dispositivo legal:
 
"O caput do art. 497 limita o seu âmbito de incidência às obrigações de fazer e de não fazer. A rigor, obrigação é apenas uma espécie de gênero dever jurídico. Trata-se de dever que tem sua gênese vinculada ao chamado direito obrigacional, no que se distingue de outros tipos de deveres, como aqueles vinculados aos direitos reais, aos direitos de família e aos sucessórios. Assim, segundo Pontes de Miranda, em sentido estrito, obrigação é a relação jurídica entre duas ou mais pessoas, de que decorre a uma delas, ao debitor ou a algumas, pode ser exigida, pela outra, creditor, ou outras, prestação.”
 
A despeito disso, a menção que se faz no art. 497 deve ser interpretada de forma mais ampla possível, estendendo-se a todos os deveres jurídicos que tenham por objeto um fazer ou não fazer, ainda que não tenham propriamente de natureza obrigacional.
 
Dessa forma, o termo obrigação, constante da redação do art. 497 do CPC deve ser entendido como abrangendo a todos os deveres jurídicos que tenham por objeto um fazer ou não fazer, ainda que não tenham propriamente natureza obrigacional.
 
Ultrapassada a questão sobre a abrangência do art. 497 do CPC, percebe-se que a sentença que verse sobre o cumprimento de obrigação de fazer e não fazer não mais submete a um processo de execução autônomo para o seu cumprimento, devendo-se conceder à parte, desde logo, a tutela especifica, determinando o juiz providências que assegurem esta ou o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
 
Isso constitui um grande avanço para que seja alcançada a tão propalada efetividade e celeridade da tutela jurisdicional, uma vez que o vencedor da demanda não mais recebe a sentença como uma mera folha de papel, destituída de valor coercitivo, que dependia do ajuizamento de uma nova ação, desta vez executiva, para ser cumprida.
 
No sistema atual do CPC, não há mais distinção, assim, entre as sentenças condenatórias (condenatórias strictu sensu, executivas e mandamentais), visto que todas são de cumprimento independentemente de ação executiva autônoma. Todas se realizam por meio de mandado expedido após a sua prolação, na mesma relação processual em que se formar a sentença. O sistema, portanto, é o da executio per officium iudicis e não mais o da actio iudicati. Ação autônoma de execução somente existirá para os títulos executivos extrajudiciais.  
 
Com efeito, atualmente, dentro do próprio processo de conhecimento, que se tornou um processo sincrético, é possível ao vencedor da demanda obter a satisfação do seu direito, de forma muito mais célere, justa e efetiva. 
 
Tanto isso é verdade que Didier Jr.  opina no sentido de que mesmo o credor que possui um título executivo tem “interesse de agir em manejar uma ação cognitiva pleiteando que lhe fosse concedida a tutela do art. 497 do CPC, ao invés de ajuizar uma ação e execução fundada nos art. 815 e seguintes do CPC”.
 
Prossegue o professor Didier Jr.  afirmando que tal deve ocorrer, pelos seguintes motivos:
 
"As medidas de apoio de que se pode valer o magistrado com base no art. 497, tendo em vista a sua atipicidade, se mostram potencialmente mais efetivas que aquelas previstas para a execução de título extrajudicial, o que revela a utilidade da opção por esta via.
 
Entretanto, trata-se de questão polêmica, para a qual ainda não houve pronunciamento dos tribunais, sendo que cumpre ressaltar que tal comportamento poderia constituir sim, ao contrário do que pensa Didier Jr., ausência de interesse de agir, visto que o ajuizamento de ação de conhecimento quando o credor já possuir um título executivo extrajudicial não se mostraria a ação adequada para o caso. 
 
A sugestão seria uma mudança legislativa, para que o juiz pudesse, também no processo de execução de título executivo extrajudicial, que versasse sobre obrigações de fazer ou mão fazer, utilizar as medidas coercitivas e de apoio previstas no art. 536 do CPC.
 
Concluindo, as alterações que houveram no código processual de 1973, das quais foram mantidas no vigente código, só vieram contribuir para a celerização e efetividade dos processos judiciais, na medida em que institui-se a ação sincrética no que concerne às obrigações de fazer e não fazer, o que trouxe, ainda, importantes medidas coercitivas e de apoio, que podem ser amplamente utilizadas pelo juízo, para a satisfação do direito do credor, ou seja, para a concretização da tutela específica ou do seu resultado prático equivalente, visando a conceder efeito mandamental às decisões judiciais, a fim de se ver os imediatos efeitos da prestação jurisdicional. 
 
      1.1 A TUTELA ESPECÍFICA E TUTELA PELO EQUIVALENTE EM PECÚNIA
 
A tutela jurisdicional como resultado pode ser dividida em tutela específica e tutela pelo equivalente em pecúnia, segundo Didier Jr. 
 
Explicita, informando que, quando o resultado alcançado pelo processo corresponder exatamente ao resultado previsto pelo direito material, ou seja, quando se dá exatamente aquilo a que o vencedor da demanda tem direito, diz-se que há tutela especifica. 
 
Ao contrário, quando não se entrega a quem tem razão o bem da vida que lhe foi tirado, mas sim um equivalente em dinheiro, diz-se que há a tutela pelo equivalente em pecúnia ou tutela substitutiva ou subsidiária. 
 
Atualmente, prossegue o referido autor,  com as reformas perpetradas pelas leis n. 8952/94 e 10.444/02, que foram utilizadas no Código vigente, a tutela especifica ganhou extrema relevância, podendo-se falar em primazia da tutela específica no processo civil brasileiro.
 
Com efeito, o CPC, em seu art. 497, caput, dispõe que “na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providencias que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.”
 
Didier Jr.  levanta interessante questão sobre o que seria “resultado prático equivalente”, nos seguintes termos: 
 
"Resta, então, saber qual o alcance dessa disposição: (i) ela autoriza que o magistrado tome providencias no sentido de permitir ao credor obter, na prática, um bem da vida equivalente, embora não-coincidente, àquele que obteria com o cumprimento espontâneo ou (ii) simplesmente ratifica o poder geral de efetivação do magistrado na busca por um resultado coincidente com aquele que o credor obteria acaso a obrigação fosse espontaneamente cumprida?
[...]
Parece-nos, contudo, que, ao autorizar o magistrado a tomar as providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento, o caput do art. 497 vai além de simplesmente permitir que o julgador se valha de medidas coercitivas diretas adequadas à obtenção do resultado final almejado. Pelo que se vê, o legislador autoriza aí que se chegue a um resultado equivalente ao do adimplemento, ainda que não totalmente coincidente. Não se trata, porém, de equivalente pecuniário, mas sim, de equivalente em fazer ou não-fazer."
 
Assim é que, segundo Didier Jr., com razão, defende que o resultado prático equivalente seria não apenas uma ratificação do poder geral de efetivação do magistrado na busca por um resultado coincidente com aquele que o credor obteria acaso a obrigação fosse espontaneamente cumprida, mas sim a obtenção de algo próximo ao almejado, porém, diferentemente de dinheiro; seria o equivalente em fazer ou não fazer. 
Com efeito, o resultado prático equivalente é aquele, diferente do pleiteado da inicial, mas que deixa o credor tão satisfeito quanto se tivesse recebido aquilo que pediu.
 
Quanto às obrigações fungíveis e infungíveis, cumpre tecer as seguintes considerações, muito bem explanadas por Theodoro Júnior: 
 
"Como ao direito repugna constranger alguém fisicamente a fazer alguma coisa e, como as obrigações de fazer e não fazer alguma coisa e, como as obrigações de fazer e não fazer dependem de um comportamento pessoal do devedor, a regra antiga dispunha que o inadimplemento, nas espécies, resolver-se-ia em perdas e danos."
 
Como sua solução era, em muitos casos, injusta e insatisfatória, criou-se a concepção da fungibilidade de certas obrigações de fazer, que seria aplicável sempre que a prestação devida não fosse personalíssima e pudesse ser cumprida a contento mediante ato de terceiro. Assim, a execução da obrigação poderia ser feita de maneira específica, proporcionando ao credor exatamente o resultado ajustado, mesmo sem a colaboração do devedor, a quem caberia suportar os custos da realização da obrigação por outrem. 
 
Quando a prestação somente pudesse ser cumprida pelo devedor, por sua natureza ou convenção, o inadimplemento somente poderia ser remediado pelo conversão em indenização, sendo a obrigação qualificada de infungível. 
 
Dessa maneira, antes da lei n. 11.382/06, caso o devedor se negasse a cumprir a obrigação de fazer ou não fazer à qual tinha sido condenado, somente quanto às obrigações fungíveis, era possível garantir a tutela especifica ao credor, mediante o procedimento lento e complicado, do qual era previsto no art. 634, do CPC de 1973. 
 
Quando se tratasse de obrigações infungíveis, o inadimplemento somente poderia ser remediado pela conversão em indenização. 
 
Porém, com as leis n. 8952/94 e 10.444/02, dos quais foram mantidos no Novo Código de Processo Civil, através dos artigos 497 e 498, os poderes do juiz para fazer cumprir especificamente as obrigações de fazer e não fazer não devem ficar restritos à autorização para que o credor realize ou mande realizar o fato devido, seja tratando-se de obrigação fungível ou infungível. 
 
Com efeito, deve o juiz adotar outras providências que, mesmo não sendo exatamente o fato devido, correspondam a algo que assegure o resultado prático equivalente ao do adimplemento, seja para obrigações de fazer fungíveis ou infungíveis. 
 
Além do que, o credor tem o direito subjetivo de exigir, por meio da tutela jurisdicional, a tutela específica, de modo que o juiz não pode, em regra, força-lo a se satisfazer com a indenização por perdas e danos, pouco se levando em conta se a obrigação a ser satisfeita é fungível ou infungível, visto que o CPC dispõe que somente se converterá em perdas e danos a obrigação de fazer ou não fazer se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente (art. 497, § 1º, do CPC). 
 
Assim é que Didier Jr. entende que:
 
"Embora o credor não possa, em regra, exigir do devedor prestação diversa daquela que fora pactuada, [...] pode-se dizer que, uma vez ocorrido o inadimplemento, surge para o credor o direito potestativo de optar entre o seu cumprimento na forma específica ou a sua conversão em pecúnia [...]. O que lhe é vedado é exigir a prestação pecuniária entes de haver o inadimplemento, seja porque inexigível a prestação, seja porque a outra parte não é obrigada a prestar coisa diversa."
 
Atualmente, o credor tem a dificuldade de escolher entre requerer a tutela específica ou o equivalente em dinheiro, não se tratando mais de faculdade do devedor, como era antes das leis 8.952/94 e 10.444/02.
 
Não se pode conceber, com isso, que haveria qualquer violação ao princípio da menor onerosidade para o devedor, posto que, com relação ao art. 805 do CPC, Humberto Theodoro Júnior dispõe o seguinte:  
 
"(O art. 805), quando permite ao juiz escolher a forma menos gravosa de realizar a execução, pressupõe a existência de mais de um meio executivo para satisfazer a prestação a que faz jus o exequente. Não se aplica para alterar aquilo que a lei lhe assegura e que somente ele tem o poder de definir: o objeto da ação, o pedido."
 
Quanto à impossibilidade do cumprimento da obrigação, tal situação deve ser analisada com cuidado, pois nem sempre configura a hipótese de possibilidade de exigência do equivalente em pecúnia, por parte do credor, conforme ensina Didier Jr.:  
 
"Se a impossibilidade decorrer do próprio negócio jurídico, a depender da situação, pode ser causa de invalidação ou mesmo de resolução do negócio, visto que a possibilidade é uma característica de que se deve revestir o objeto de uma obrigação para que ela seja válida.
[...]
Não bastasse isso, se a impossibilidade decorre do fato alheio à vontade e à conduta de devedor (caso fortuito ou força maior, por exemplo), ela dá causa à extinção da obrigação, sem que se possa falar em perdas e danos."
 
A impossibilidade capaz de gerar a conversão da obrigação em prestação pecuniária há de ser (i) superveniente, (ii) absoluta, (iii) decorre de culpa do devedor. 
 
Dessa forma, a única impossibilidade de cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer capaz de gerar a sua conversão em prestação pecuniária é quando for superveniente, absoluta e de correr de culpa do devedor, visto que, em caso contrário, pode se tratar até mesmo de invalidação ou resolução do negócio jurídico. 
 
Cumpre ressaltar, ainda, que a diferenciação entre obrigações fungíveis e obrigações infungíveis perdeu um pouco a sua importância nos dias de hoje para a obtenção de tutela específica, por parte do credor, pois, mesmo nos casos de obrigações infungíveis, se não ocorrer o previsto no art. 497, § 1º do CPC, deve o Juiz utilizar, em um primeiro momento, as medidas que entenda cabíveis para a concessão da tutela específica, seja impondo o pagamento de multa coercitiva ou a adoção de qualquer outra medida coercitiva ou de apoio que entendesse devida. 
 
Cabe observar, quanto a este ponto, entretanto, a redação dos artigos 247 e 389 do Código Civil de 2002:
 
"Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exequível. 
 
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado."
 
Sobre os dispositivos legais supracitado, Theodoro Júnior  aduz o seguinte:
 
Esse dispositivo da lei material veio pôr fim à discussão sobre cabimento ou não da astrainte nas obrigações personalíssimas ou infungíveis, visto que a sanção legalmente estabelecida é a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos. [...] Nessa sistemática de direito positivo, portanto, a multa cominatória foca restrita aos casos de obrigações fungíveis. 
 
Contudo, tal entendimento constituiria um retrocesso, haja vista que, com o Código Civil de 2002, passar-se-ia a ter a primazia da tutela específica somente para a prestação de obrigações fungíveis, o que não era o espírito das leis processuais civis alteradoras do Código de Processo Civil.
 
Assim, sobre o assunto, Didier Jr. , por sua vez, aduz o seguinte:
 
Apesar de a sua redação estar defasada nesses pontos, tem-se tentado dar ao Código Civil de 2002 uma interpretação conforme o regramento previsto no art. 461 do CPC e conforme o próprio ideal de tutela jurisdicional efetiva, previsto no art. 5º, XXXV, da CF. Sendo assim, costuma-se a dizer que as obrigações de fazer e de não fazer deverão, inicialmente, ser objeto de tutela específica, mas poderão ser convertidas em prestação pecuniária, tal como autoriza o art. 389 do Código Civil, nos casos previstos no art. 461. Isto é: os arts. 389 e 247 do Código Civil funcionam simplesmente como dispositivos de autorização para a conversão de tais obrigações em prestação pecuniária, desde que presentes os pressupostos para essa conversão, não revelando uma opção legislativa pela tutela do equivalente pecuniário. 
 
Esse é o entendimento que melhor se coaduna com o espírito legislador processual civil brasileiro dos últimos tempos, devendo, assim, os artigos 247 e 389 do Código Civil ser interpretados no sentido de que funcionam apenas como autorizadores da conversão de tais obrigações em prestação pecuniária, desde que presentes os pressupostos para essa conversão, não revelando uma opção legislativa pela tutela do equivalente pecuniário. 
 
2 DOS MEIOS COERCITIVOS E DAS MEDIDAS DE APOIO NO CUMPRIMENTO DA SENTENÇA NAS OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER 
 
      2.1 GENERALIDADES
 
Há duas técnicas de execução forçada que podem ser utilizadas em direito processual civil: a direta ou expropriação, por meio da qual o Estado-Juiz realiza a prestação pelo devedor a cumprir a obrigação, atemorizando-o, por meio de cominação de multa ou incentivando-o, por meio da sanção premial (exemplo: benefício da isenção de custas processuais e honorários advocatícios na monitória). 
 
A coerção indireta pode ser pessoal (prisão civil) ou patrimonial (multa). É dita indireta porque não conduz diretamente à tutela do direito, limitando-se a incidir sobre a vontade do réu para que a tutela do direito seja prestada. 
 
Quando for possível a efetivação da tutela específica ou a obtenção de um resultado prático equivalente, o juiz, atuando por meio de execução indireta, poderá adotar medidas coercitivas ou de apoio, na própria sentença, em decisão interlocutória de antecipação de tutela ou em atos processuais posteriores, por não existir determinação legal em contrário. 
 
Segundo Didier Jr.,  várias técnicas contribuem para a obtenção de um resultado prático satisfatório, nas execuções que versam sobre obrigações de fazer e não fazer são: o fato de a efetivação dessas decisões poder contar, ou não, com a participação direta devedor; a concessão de um poder geral de efetivação ao magistrado, mediante a ampliação do leque da possíveis medidas executivas de que se pode utilizar para concretização de suas decisões; a não-adstrição da decisão judicial o pedido quanto à medida coercitiva a ser imposta; e a possibilidade de alteração da medida que se mostrou ineficaz.
 
Com efeito, o art. 536 do CPC, determina, por meio de uma lista exemplificativa, que o juiz poderá “impor multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.”
 
É possível, assim, segundo Didier Jr.,  que o juiz adote qualquer medida que, à luz do caso concreto, se mostre necessária, razoável e adequada para a efetivação do direito ameaçado ou lesado, como por exemplo a obstaculização de veiculação de matéria jornalística ou a imposição de uma sanção premial, em vez da multa diária, por exemplo. 
 
É possível, ainda, que em se tratando de obrigação fungível, o magistrado determine que terceiro a cumpra, em lugar do devedor, sem que se precise observar o procedimento, já revogado, previsto no art. 817 do CPC. Basta que se incumba o autor de indicar a pessoa que prestará o fato, devendo ela apresentar sua proposta de honorários e de despesas, além do projeto de cumprimento, oportunizando-se, em seguida, que o réu se manifeste sobre o assunto.
 
Assim é que o rol previsto no art. 536 é meramente exemplificativo, devendo o juiz aplicar, respeitando o princípio da proporcionalidade, a medida coercitiva ou de apoio que se mostrar mais adequada ao caso concreto.
 
Theodoro Júnior,  sobre o tema, aduz o seguinte:
 
Embora o rol das medidas sub-rogatórias ou de apoio contido no § 1º do art. 536 seja meramente exemplificativo, o juiz não tem um poder ilimitado na adoção de outras providências para atingir a execução específica. Expedientes condenados pela ordem jurídica, como a prisão civil por dívida, obviamente não se incluem nos meios de coerção utilizáveis na espécie.
 
Na escolha de providências extravagantes, preconiza-se a observância dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, de sorte a guardar a relação de adequação com o fim perseguido, não podendo acarretar para o réu sacrifício maior do que o necessário.
 
Sobre as medidas de apoio previstas exemplificativamente no rol do art. 536, § 1º, do CPC, o eminente professor Theodoro Junior, continua, dispondo o seguinte:
 
"A busca e apreensão, in casu, é providência que pode se referir, no todo ou em parte, ao objeto criado pela execução da obrigação de fazer, bem como a alguma coisa necessária ou útil a tal execução (exemplos: materiais, projetos, ferramentas). As ordens desse tipo são tomadas incidentalmente, dentro do processo em curso, sem instauração de verdadeira execução para entrega de coisa."
 
A entrega de coisa para satisfazer o direito a “resultado prático equivalente” à prestação devida não é de ser descartado. As medidas sub-rogatórias do § 1º tanto são utilizáveis como preparação do julgamento do processo de conhecimento, como podem ser providências que a sentença utilize para determinar o conteúdo da condenação. Nessa última hipótese, a busca e apreensão dar-se-ia, na fase de execução da sentença onde ficaria assegurado ao credor uma coisa determinada, cuja entrega lhe proporcionaria o “resultado prático equivalente”. Imagine-se o fornecedor de um automóvel que não consegue realizar a contento a garantia de pleno funcionamento da máquina. O juiz pode transformar a obrigação de fazer (reparar o veículo) em obrigação de entregar outro automóvel em condições adequadas de operação.
 
A “remoção de pessoas e coisas”, prevista no art. 536, § 1º do CPC, difere da busca e apreensão porque não se destina a proporcionar a entrega do objeto apreendido ao credor. Satisfaz a obrigação de deslocamento daquilo que obsta ao credor o exercício de seu direito (ex.: remoção de placa que viola marca ou nome comercial). Em relação a pessoas, pode-se pensar na remoção de grevistas que se recusam a deixar o recinto de trabalho, por exemplo, ou no empreiteiro que não retira seu pessoal da obra cuja continuidade foi adjudicada a outrem.
 
O “desfazimento de obras”, também previsto no § 1º, do art. 536, não se restringe ao cumprimento da sentença que o tenha imposto como decorrência de obrigação de não fazer. O que se visa é permitir o expediente mesmo incidentalmente, até mesmo como antecipação de tutela, quando presentes os seus pressupostos legais. Em tais casos a demolição se dará em caráter de urgência, como cumprimento de simples mandado, sem se sujeitar ao processo de execução, como, aliás, ocorre que as medidas cautelares e demais provimentos de urgência. 
 
O “impedimento de atividade nociva”, igualmente autorizado pelo § 1º, do art. 536, pode ocorrer em caráter preventivo ou repressivo e segue o procedimento mandamental, para pronta efetivação. Pode ser coordenado com imposição de multa e outras medidas coercitivas como a remoção de bens e pessoas. 
Para qualquer medida enquadrável nas diligências relacionadas a tutela específica ou seu equivalente prático, o juiz estará sempre autorizado a requisitar a força policial, na hipótese de ocorrer resistência injustificável à diligência. Trata-se de faculdade inerente à autoridade do órgão judicial.
 
Assim é que a busca e apreensão serve para apreender o objeto da execução ou o seu equivalente; a remoção de coisas e pessoas serve para deslocar aquilo que obsta ao credor o exercício de seu direito; o desfazimento de obras não se resume à decisão final, podendo ser levado a efeito até mesmo em tutela de urgência; e o impedimento de atividade nociva pode ocorrer em caráter preventivo ou repressivo.
 
O art. 536, § 1º do CPC consagra, assim, segundo Didier Jr.  o poder geral de efetivação ou clausula geral executiva, na qual estabelece um rol meramente exemplificativo das medidas executivas que podem ser adotadas pelo magistrado, outorgando-lhe poder para, à luz do caso concreto, valer-se da providência que entender necessário à efetivação da decisão judicial.
 
Prossegue o referido autor afirmando que o art. 536, § 1º do CPC, atende ao direito fundamental à tutela executiva, que consiste “na exigência de um sistema completo de tutela executiva, no qual existem meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva.” 
 
Daí reside a necessidade, segundo o professor Didier Jr. , de o magistrado interpretar esse direito com se interpretam os direitos fundamentais, de modo a dar-lhes o máximo de eficácia; afastar, aplicado o princípio da proporcionalidade, qualquer regra que se coloque como obstáculo; e ter o poder-dever de adotar os meios executivos que se revelem necessários à prestação integral da tutela executiva, ainda que não previstos em lei ou por ela expressamente vedados. 
 
Cabe lembrar, ainda, que apesar de o CPC falar em faculdade ou poder discricionário do juiz na aplicação das medidas coercitivas e de apoio para a obtenção da tutela especifica ou do resultado prático equivalente, nos cumprimentos de sentença que versem sobre obrigações de fazer e de não fazer, trata-se na verdade de um poder-dever, na medida em que cumpre ao juiz utilizar todos os meios possíveis para a efetivação de seus julgados, sob pena de desmoralização do próprio Poder Judiciário. 
 
Assim é que, quando verificada a possibilidade de cumprimento da tutela específica ou do resultado prático equivalente, é dever do juiz impor a multa coercitiva ou qualquer outra medida coercitiva como forma de compelir o devedor a cumprir a obrigação à qual foi condenado, salvo se o credor optar pela conversão da tutela especifica pelo equivalente em pecúnia ou se tornar impossível a obtenção da tutela especifica ou do resultado prático equivalente. 
 
Não é necessário nem que tais medidas integrem os pedidos formulados pelo autor na inicial ou mesmo que o juiz se adstrinja às medidas requeridas pelo credor, visto fazerem parte dos poderes do juiz para compelir o devedor ao cumprimento da obrigação à qual foi condenado, de modo que possa entregar o bem da vida devido ao credor. Podem, dessa maneira, as medidas coercitivas ou de apoio ser cominadas ex officio. 
 
Não há que se falar, então, em violação ai princípio da congruência, segundo o qual a decisão deve ficar adstrita ao pedido formulado pela parte, no caso de o juiz utilizar-se de alguma medida coercitiva ou de apoio, no cumprimento de sentenças que versem sobre obrigações de fazer e não fazer. 
 
Nesse sentido, já decidiu o STJ , conforme acórdão ementado da seguinte forma: 
 
"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA ESPECÍFICA. IMPOSSIBILIDADE. PERDAS E DANOS. 1. Sentença que, ao julgar procedente o pedido e, com apoio no art. 461, segunda parte, do Código de Processo Civil, determina a adoção de providências tendentes a assegurar o resultado prático da obrigação postulada na inicial, não afronta as disposições dos arts. 128  e 460  do mesmo código. 2. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não-provido. (STJ - REsp: 332772 SP 2001/0091333-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 04/05/2006, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 28/06/2006 p. 225)"
 
Sobre o assunto, Marinoni  assim se posiciona:
 
"A necessidade de dar maior poder ao juiz para a efetiva tutela do direitos, espelhada, em primeiro lugar, na quebra do princípio da tipicidade da formas executivas e na concentração da execução no processo de conhecimento, trouxe, ainda, a superação da ideia de absoluta congruência entre o pedido e a sentença.
(...)
Note-se que a superação dessa ideia é uma consequência lógica da quebra do princípio da tipicidade dos meios executivos e da concentração da execução no processo de conhecimento, uma vez que todas elas se destinam a dar maior mobilidade ao juiz – e assim maior poder de execução. A ligação entre tudo isso, ademais, deriva do fato de que a regra da congruência, assim como o princípio da tipicidade e a separação entre conhecimento e execução, foi estabelecida a partir da premissa de que era preciso conter o poder do juiz para evitar o risco de violação da liberdade do litigante. Tanto é verdade que, quando se pensa em congruência, afirma-se que sua finalidade é a de evitar que a jurisdição atue de ofício, o que poderia comprometer sua imparcialidade (...)"
 
Essa proibição tinha que ser minimizada para que o juiz pudesse responder à sua função de dar efetiva tutela aos direitos. Melhor explicando, essa regra não poderia mais prevalecer, de modo absoluto, diante das novas situações de direito substancial e da constatação de que o juiz não pode mais ser visto como um “inimigo”, mas como representante de um Estado que tem consciência que a efetiva proteção dos direitos é fundamental para a justa organização social.  
 
Assim é que o princípio da congruência não deve ser visto como absoluto, em decorrência da quebra do princípio da tipicidade dos meios executivos e da concentração da execução no processo de conhecimento, visto que o objetivo principal do processo civil hoje é dar maior mobilidade ao juiz, para que tenha maiores poderes executivos. 
 
A decisão que determina a aplicação de medidas coercitivas e de apoio não preclui para o juízo ou, em outras palavras, não faz coisa julgada e não integra o patrimônio do credor, na medida em que pode ser revista a qualquer momento, em nome da conveniência e utilidade para a obtenção da tutela específica ou do resultado prático equivalente, nos cumprimentos de sentença que versem sobre obrigações de fazer e não fazer.
 
Tanto é verdade que o art. 537, do CPC dispõe que “O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva, obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.”
 
Assim é que Didier Jr.  entende que “é lícito ao magistrado, de ofício ou a requerimento da parte interessada, alterar a medida coercitiva imposta quando ela se mostrar ineficaz para a efetivação da decisão judicial ou quando ela se mostrar ineficaz para a efetivação da decisão judicial ou quando se mostrar excessiva para a obtenção do resultado almejado.”
 
Apesar de o art. 537 do CPC referir-se unicamente à multa, prossegue o professor Didier Jr., ele deve ser interpretado de forma ampla para abranger também toda e qualquer medida coercitiva, seja ela direta ou indireta.
 
Sobre o assunto, Theodoro Junior  pondera o seguinte:
 
"A meu ver, não se deve adotar nenhuma posição rígida a respeito do tema. O fato de prolongar-se muito a inadimplência, mesmo depois de cominada a multa diária, representará, sem dúvida, motivo para melhor avaliação da pena como medida executiva indireta e funcionará como indício de sua inadequação à espécie do processo. Mas daí a dizer, só por isso que, ela deverá cessar de incidir, vai uma distância muito grande e o argumento envolve um raciocínio nem sempre convincente.
[...]
O devedor pode justamente estar se prevalecendo de seu poderio econômico para prejudicar o credor, que depende substancialmente da prestação in natura para seus negócios. Parece-me correta a ponderação de EDUARDO TALAMINI de que o juiz não pode singularmente “premiar a recalcitrância do réu”. Em vez de se preocupar com o possível “enriquecimento sem causa” gerado pela indefinida protelação do cumprimento da sentença, deverá o juiz indagar se houve algum outro motivo para concluir que a multa se tornou inadequada ao seu objetivo institucional."
 
Com efeito, nem sempre deve ser revista a decisão do juiz, que cominou multa ou determinou a aplicação de outras medidas coercitivas ou de apoio, pelo simples fato de o réu não ter cumprido com a sua obrigação e estar alongando a sua inadimplência, uma vez que o devedor pode estar utilizando-se de estratégia para não cumprir com a obrigação à qual foi condenado e não sofrer nenhuma outra forma de coerção.
 
Todo raciocínio anteriormente descrito também deve ser aplicado em caso de execução provisória, desde que respeitados os seguintes princípios desse instituto: o da responsabilidade objetiva do credor, caso a execução provisória venha a causar algum dano ao devedor; o da restituição ao estado anterior, no caso de sobrevir acórdão que anule ou modifique a decisão exequenda; e o da apresentação de caução, em caso levantamento de depósito em dinheiro e da prática de atos que importem alienação de propriedade ou dos quais possa resultar grave dano ao executado. 
 
A pedra de toque para a utilização das medidas coercitivas ou de apoio, nos cumprimentos de sentença de obrigações de fazer e de não fazer é o princípio da proporcionalidade. 
 
Didier Jr.,  sobre esse princípio, assim se manifesta:
 
Por esse princípio, três subprincípios devem ser observados na escolha, pelo magistrado, da providência material tendente a tutelar o bem da vida buscado pelo credor: (i) a adequação, segundo a qual o fazer ou não fazer imposto pelo juiz não pode infringir o ordenamento jurídico, devendo ser adequado a que se atinja o bem da vida almejado; (ii) a necessidade (ou exigibilidade), segundo a qual a ação material eleita deve ter capacidade de realizar, no plano dos fatos, a tutela do direito, causando menor restrição possível ao devedor; (iii) e a proporcionalidade em sentido estrito, segundo a qual o magistrado, antes de eleger a ação material a ser imposta, deve sopesar as vantagens e desvantagens da sua aplicação, buscando a solução que melhor atenda aos valores em conflito. 
 
Por meio deste princípio, dessa forma, a cominação de multa deve observar parâmetros razoáveis, a compatibilidade entre os fins e os meios, visando à obediência ao espírito da lei e à proibição de excessos, devendo, assim, ao juiz impor a multa coercitiva na medida necessária ao entendimento do cumprimento do julgado.
 
Assis  entende o seguinte, quanto à aplicação do princípio da proporcionalidade para cominação do valor da multa:
 
O valor da multa não guarda relação com o conteúdo econômico do direito posto em causa. Assim, um salário mínimo por dia de atraso, ou qualquer outro interstício temporal, no cumprimento representa valor assaz eficiente para pressionar modesto fornecedor de serviços (por exemplo, alguém que deixou de consertar a máquina de lavar roupa); porém, tal multa é ineficiente para compelir montadora de automóveis a corrigir os defeitos estruturais de milhares de veículos. 
 
Sem dúvida alguma, a multa é a medida coercitiva por excelência, sendo a mais utilizada na prática forense e, por isso, será objeto de uma maior análise no capítulo seguinte, cabendo ser ressaltado nesse momento que o seu valor de cominação deve ser analisado caso a caso, utilizando-se sempre o princípio da proporcionalidade.
 
      2.2 A MULTA COERCITIVA PARA O CUMPRIMENTO DE SENTENÇA NAS PRESTAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER
 
A multa ou astreinte é a medida coercitiva por excelência para a obtenção da tutela especifica ou do resultado prático equivalente, nos cumprimentos de sentença que versem sobre obrigações de fazer e de não fazer.
 
Assis  ensina que a multa exerce uma pressão psicológica sobre o vencido, apresentando apenas a fraqueza intrínseca de não induzir ao cumprimento o destinatário da ordem desprovido de patrimônio penhorável. 
 
Objetiva-se o cumprimento espontâneo do julgado. Coage-se psicologicamente o réu devedor a cumprir a obrigação, de forma que seja melhor para ele cumprir espontaneamente o decisum a ter que amargar os prejuízos da sanção imposta para o caso de descumprimento. 
 
O juiz, ao cominá-la, deve fazê-lo, por obvio, em decisão motivada, abrangendo todos os aspectos envolvidos, tais como valor, termo inicial, periodicidade e duração. Ela só para de correr se o executado atender o comando do título executivo, se a prestação se tornar impossível, irrealizável ou se o credor desistir da prestação in natura ou se, em caso de execução provisória, a decisão exequenda seja modificada ou anulada.
 
A astreinte se diferencia da multa prevista no art. 77 do CPC , nos seguintes aspectos: a multa do art. 77 é punitiva, fixa e reverte ao Estado; a multa do art. 537 é coercitiva, para forçar o cumprimento de uma obrigação, é normalmente periódica e revogável ou modificável e reverte às partes.
 
Com relação à multa prevista no art. 523 do CPC , por sua vez, as diferenças são as seguintes: a multa do art. 523 do CPC é punitiva e fixa, não possuindo caráter coercitivo, sendo que ambas revertem às partes.
 
Assim é que a multa prevista no art. 536 do CPC não é nem indenizatória, nem punitiva; é coercitiva.
 
Daniel Maia Netto  ensina o seguinte, quanto à natureza jurídica das astreintes:
 
"Dada a natureza coercitiva, a multa em apreço destina-se prioritariamente ao cumprimento da obrigação, sem visualizar a questão reparatória (...)."
 
Primeiramente, observamos que o valor da multa pecuniária será devido independentemente das perdas e danos. Isto, inclusive, é regra em nossa legislação instrumental, que no art. 500, estabelece que a multa será devida independentemente das perdas e danos. 
 
Sendo assim, são perfeitamente cumuláveis a multa e a indenização por perdas e danos. 
 
Evidentemente, uma vez desprovida da finalidade ressarcitória, a multa poderá ser devida mesmo no caso de ausência de qualquer prejuízo em decorrência do não cumprimento da obrigação.
 
Por força disto, podemos afirmar que o valor da multa não está adstrito ao valor da obrigação principal. 
 
Assim é que a multa deve ser dissociada da indenização por perdas e danos e de qualquer ideia de punição, por ter caráter meramente coercitivo, e não indenizatório ou punitivo.
 
Didier Jr.  aduz, ainda, que, justamente por ser coercitiva, não pode ser irrisória, pois deve “gerar no íntimo do devedor o temor do descumprimento”; deve reverter às partes, podendo, inclusive ser cumulativa à indenização por perdas e danos e à multa do art. 77 do CPC.
 
Quanto ao valor, conforme referido acima, deve ser cominada respeitando-se o princípio da proporcionalidade, não existindo, porém, teto para a mesma, nem mesmo no procedimento dos Juizados Especiais, podendo, ainda, ultrapassar o valor da própria obrigação. Contudo, nos casos em que a multa se tornar desproporcional, cabe ao juiz reduzi-la ou aumenta-la, se tiver sido arbitrada em valor insuficiente. 
 
No que concerne ao destinatário da multa, este pode ser o autor, o réu ou mesmo um terceiro, ou seja, qualquer pessoa que deva cumprir prestação de faze ou não fazer decidida em um processo judicial. 
 
A título de exemplo, o juiz pode determinar que uma pessoa jurídica cumpra uma obrigação, impondo a multa a ela e à pessoa física que tenha poderes para determinar o cumprimento da ordem judicial. 
 
A Fazenda Pública também pode ser alvo da multa coercitiva prevista no art. 536 do CPC.
 
Greco Filho  entende de forma diversa nos seguintes termos:
 
"São inviáveis a cominação e a imposição de multa contra pessoa jurídica de direito público. Os meios executivos contra a Fazenda Pública são outros. Contra esta a multa não tem nenhum efeito cominatório, porque não é o administrador renitente que irá pagá-la, mas os cofres públicos, ou seja, o povo. Não tendo efeito cominatório, não tem sentido a sua utilização como meio executivo."
 
Entretanto, Didier Jr.  sustenta, concordando com Eduardo Talamini, que a má conduta do administrador não pode servir de argumento para eximir os entes públicos da submissão a esse tipo de coerção processual. Em tais casos, cumpre ao poder público responsabilizar o servidor renitente nas esferas administrativas, civil e criminalmente, se for o caso, cabendo-lhe ressarcir o erário quando verificada atuação dolosa ou culposa.
 
Sustenta, ainda, o seguinte: 
 
"De qualquer sorte, para evitar a renitência dos maus gestores, nada impede que o magistrado, no exercício do seu poder geral de efetivação, imponha as astreintes diretamente ao agente público (pessoa física) responsável por tomar a providência necessária ao cumprimento da prestação."
 
Assim é que Didier Jr. vai mais longe ao afirmar que a multa coercitiva pode ser imposta tanto para a Fazenda Pública quanto para o administrador recalcitrante.
 
Theodoro Júnior afirma, quanto à multa prevista no art. 536 do CPC, que, “se o juiz verificar que a prestação específica já era impossível desde o tempo da sentença, não poderá manter na execução a exigência da multa indevidamente estipulada pelo inadimplemento da obrigação de fazer.” 
 
Tal faz sentido na medida em que a multa do art. 536 do CPC não tem caráter punitivo, não se incorporando assim ao crédito exequendo em todas as hipóteses.
 
Com efeito, dado o seu caráter coercitivo, sua finalidade é tão somente possibilitar de modo mais célere e efetivo a obtenção da tutela específica ou do resultado prático equivalente, não servindo para penalizar o devedor. 
 
Dessa maneira, sua finalidade não pode ser cumprida, porque a prestação in natura tornou-se impossível, desde antes da sentença, mesmo que por culpa do devedor, por exemplo, não faz sentido manter a multa na execução do julgado, visto que não se incorporou ao patrimônio do credor.
 
Ela somente se incorporará ao patrimônio do credor se a impossibilidade da prestação in natura da obrigação de fazer ou não fazer for superveniente à sentença.
 
Assim, verifica-se que, em apenas 2 casos, a multa não poderá ser utilizada ou será ineficaz: quando a prestação da tutela específica for impossível desde antes da sentença e quando o devedor for insolvente.
Sobre essa questão, Marinoni  entende que “convém deixar claro, desde logo, que multa não poderá ser usada – nem poderia - contra a pessoa que não possui patrimônio. O seu objetivo não é o de castigar o inadimplente. É o dissuadir - aquele que possui patrimônio - a não pagar.”
 
Quanto a execução da multa coercitiva, deve seguir o rito das execuções para satisfação de prestação pecuniária, ou seja, o rito previsto no art. 523 e seguintes do CPC, devendo ser utilizado o útil e célere mecanismo da penhora on line, sempre que o devedor se mostrar renitente, como forma de conferir executividade máxima à obrigação de pagar quantia.
 
Com efeito, de nada terá efeito a cominação da multa, se o executado sentir que pode esquivar-se, ou pelo menos postergar, tanto o pagamento da multa, quanto o cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer.
 
Em virtude de seu caráter processual, o que autoriza a exigibilidade da multa pecuniária é a violação da ordem judicial, é o desrespeito do réu ao poder jurisdicional. O seu “fato gerador” considera apenas e tão somente a relação jurídica existente entre as partes e juiz, o dever daquela em atender às ordens deste, enquanto forem eficazes. 
 
Nesse sentido, o seguinte julgado:
 
"AGRAVO RETIDO Tirado da decisão que indeferiu acareação entre testemunhas – Providência probatória inútil – inteligência dos artigos 130 e 400, I e II, do CPC – improvimento. As astreintes foram instituídas para convencer o devedor a cumprir a obrigação de fazer em tempo razoável; quando ocorre incumprimento injustificado, com o devedor pouco ou nada importando com a possível incidência das astreintes, a sua exigibilidade passa a ser questão de honra para a efetividade do processo (art. 5º, XXXV, da CRFB) - Improvimento da apelação. (Apelação cível n. 119.016-4/0 – Taubaté – 3ª Câmara de Direito Privado - Relator: Ênio Santarelli Zuliani – 29.05.01)."
 
Porém, no que concerne ao momento de exigibilidade da multa, Humberto Theodoro Junior  ensina que “pode haver execução da multa cominatória tanto em face da decisão de antecipação de tutela como da sentença definitiva. No primeiro caso, porém, a execução será provisória”.
 
Ou seja, o professor Theodoro Junior entende que a execução da multa pode ocorrer mesmo antes do transito em julgado da sentença, porém, nesse caso, será provisória.
 
Didier Jr.,  por sua vez, completa o raciocínio acima, no seguinte sentido, seguindo o entendimento de Talamini: 
 
"A multa é exigível “assim que eficaz a decisão que a impôs – ou seja, quando não mais sujeita a recurso com efeito suspensivo ex lege”. Com base nesse premissa, a multa fixada em decisão antecipatória da tutela seria exigível desde logo, pois o agravo não tem, em regra, efeito suspensivo, por expressa disposição de lei (a menos que, excepcionalmente, o relator do recurso lhe atribua tal efeito, na forma do art. 1.019, I e 1.012, § 4º do CPC). Sendo assim, caberia, em sua opinião, execução provisória do crédito."
 
O citado autor reputa que a inexequibilidade imediata da multa que acompanha a tutela antecipada retiraria boa parte da eficiência concreta do meio coercitivo e, consequentemente, das próprias chances de sucesso da antecipação, pois não haveria ameaça de pronta afetação do patrimônio do réu. Em sua opinião, a perspectiva de remota execução não pressiona nem impressiona.
 
Ainda segundo TALAMINI, se ao final do processo se concluir que o autor não tinha direito à tutela específica (foi vencido), “ficará sem efeito o crédito derivado da multa que eventualmente incidiu”, perdendo o objeto o objeto a execução provisória eventualmente iniciada. Se o beneficiário da multa teve negado o seu direito à tutela específica após o trânsito em julgado (por ação rescisória, por exemplo), o crédito eventualmente executado e satisfeito deverá ser devolvido ao vencedor, eis que a multa não vem punir, e sim serve para resguardar o direito da parte que pediu sua imposição. Assim, se o final não viu certificado o direito que pretendia fosse resguardado, não há porque receber o valor da multa.
 
Assim, a qualquer momento, pode o credor executar a multa coercitiva, provisória ou definitivamente, só devendo, entretanto, ingressar em seu patrimônio a multa (o valor pecuniário) após decisão definitiva de que é vencedor na demanda. 
 
Vale lembrar que não é possível executar multa judicial, qualquer que seja ela, sem previamente submetê-la ao procedimento de liquidação. Só após tal procedimento é que terá o título executivo judicial liquido, certo e exigível. Essa liquidação compreenderá não só a comprovação de que a prestação não se cumpriu no prazo assinado, como também de quanto durou o retardamento. Se esses dados já estiveram certificados nos autos, a liquidação se resumirá nem simples cálculo aritmético; havendo necessidade de apuração de dados novos, o procedimento terá de ser o da liquidação por artigos. 
 
Deve ser ressaltado, ainda, que, como o valor da multa pode ser revisto pelo juiz, a execução da multa poderá sofrer modificações, no decorrer do procedimento executório, sem que isso constitua qualquer ato contra o instituto da coisa julgada, como visto anteriormente.
 
Theodoro Junior,  nesse particular, refere que:
 
"A multa uma vez fixada não se torna imutável, pois ao juiz da execução atribui-se poder de ampliá-la ou reduzi-la, para mantê-la dentro dos parâmetros variáveis mas sempre necessários, da “suficiência” e da “compatibilidade”; mesmo quando a multa seja estabelecida na sentença final, o transito em julgado não impede que ocorra sua revisão durante o processo de execução; ela não integra o mérito da sentença e como simples medida executiva indireta não se recobre do manto da res iudicata."
 
Assim é que o valor da multa não fica coberto pelo manto da coisa julgada, podendo ser alterado, dentro do princípio da proporcionalidade, sempre que o juiz entender necessário.
 
Dessa forma, a execução da multa pecuniária pode vir a sofrer modificações, quanto ao valor exequendo, se houver alteração do valor da multa fixado pelo juiz.
 
Ademais, se a obrigação se converter em perdas e danos, já não há mais razão para praticar um expediente sub-rogatório cuja existência pressupõe a exigibilidade in natura da obrigação de fazer. Nesse caso, o devedor permanecerá responsável pelas astreintes vencidas até quando constatou a inviabilidade do prosseguimento da execução específica. 
 
2.3 A PRISÃO CIVIL
 
Vale observar que há doutrinadores, tal como Marinoni , que defendem a decretação de prisão civil, como medida coercitiva para o cumprimento de sentenças que versem sobre a obrigação de fazer e não fazer, o que, entretanto, constitui entendimento isolado na doutrina, a teor do disposto no art. 5º, LXVII da CRFB.
Ensina o seguinte o referido doutrinador: 
 
Considerando a tutela inibitória que impõe um não-fazer, a tutela inibitória que impõe um fazer e a tutela de remoção de ilícito, é fácil concluir que a prisão poderá ser utilizada para impor um não-fazer ou mesmo para impor um fazer infungível que não implique em disposição de dinheiro e seja imprescindível à efetiva proteção de um direito. Nesses casos, ao mesmo tempo em que prisão não estará sendo usada para constranger o demandado a dispor de patrimônio, ela estará viabilizando – no caso em que a multa e a medida de execução direta não se mostrarem adequadas – a efetiva prevenção do direito, ou melhor, a tutela jurisdicional específica por excelência, única a permitir a tutela dos direitos que não se conciliam com o ressarcimento. 
 
Didier Jr.,  por sua vez, entende que o termo “dívida”, expresso no art. 5º, LXVII da CRFB, consiste em uma obrigação de cunho patrimonial.
 
Assim, entende o seguinte, quanto à possibilidade de utilização da prisão civil como medida coercitiva no processo civil:
 
"Um obrigação de fazer, de não fazer ou de dar coisa distinta de dinheiro de conteúdo patrimonial não pode ser efetivada por prisão civil. Cabe, em tese, prisão civil como medida executiva atípica para a efetivação de decisão judicial que reconheça direito não patrimonial (non Money judgement).
[...]
Essa opção não representa, em absoluto, em desprezo à liberdade individual. Apenas significa dizer que à liberdade individual não é (e não pode ser) um valor absoluto, de modo que ela deve, sim, ser protegida, mas pode também ser restringida nos casos em que a prisão civil se mostrar como único meio idôneo, necessário e razoável à realização de outros direitos fundamentais.
[...]
É natura, contudo, que, diante do valor inerente à liberdade individual, a prisão civil – e isso é um ponto pacifico para os que, como nós, admitem como medida coercitiva atípica – só deve ser utilizada em último caso, quando não foi possível alcançar a tutela específica ou o resultado prático equivalente por nenhum outro meio. Deve-se lembrar ainda que essa medida não pode ser utilizada quando o cumprimento da ordem judicial exigir que a parte tenha a dispor de parte de seu patrimônio.
[...]
Além disso, o magistrado, antes de decretá-la, deve garantir o exercício do contraditório, permitindo que as partes, sobretudo o destinatário da medida, falem sobre o assunto e, se for o caso, produzam prova para demonstrar o que for necessário. No mais, é prudente que o julgador, optando por impor a prisão civil, fixe desde logo o seu prazo de duração, salientando que o cumprimento, pelo devedor, da prestação imposta faz cessar de imediato a incidência da medida coercitiva."
 
Dessa forma, o professor Didier Jr. defende que não constitui inconstitucionalidade a decretação de prisão como medida coercitiva para o cumprimento de obrigação de fazer e de não fazer de cunho não patrimonial, a exemplo dos direitos da personalidade.
 
Entretanto, Moraes  afirma que as hipóteses excepcionais que autorizam a prisão civil, previstas no CRFB, “são taxativas, impossibilitando seu alargamento por determinação do legislador ordinário.”
 
Assis, ao expor sobre a necessidade de entrega da tutela específica ao vencedor da demanda, afirma o seguinte: 
 
Bastará ao vencedor, no entanto, a emissão de ordem. É preciso que seja cumprida no mundo real. Ora, dirigida a servidores públicos ou a particulares em colaboração com o Poder Público, dificilmente surgirá campo propicio à rebeldia e ao descumprimento.
 
Por exemplo, o oficial público que recebe ordem do juiz para alterar seu registro, ou a autoridade administrativa que recebe ordem para interditar o estabelecimento que emite sons além da hora e dos limites permitidos, nenhum não motivo concreto tem, via de regra, para desobedecer ao juiz; porém, o empresário que recebe ordem para cessar as emanações poluidoras, ou instalar equipamentos que a evite, já exibe interesses econômicos para arrostar a autoridade do juiz. Nos países anglo-saxônicos por muitos vistos como paradigma de eficiência, o meio para induzir à pronta obediência consiste em impor sanções ao destinatário do injunction. E a sanção mais eficiente é a prisão do recalcitrante.
 
Ora o art. 536, § 1º do CPC, a despeito das controvérsias, não autoriza semelhante providência, salvo a prisão em flagrante pelo crime de desobediência, cuja caracterização oferece inúmeras dificuldades.
 
Assim é que, como a maioria dos doutrinadores brasileiros, Assis entende que somente pode ocorrer prisão civil por dívida, nos casos de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e de depositário infiel, seja pela ação de depósito regulada no Código Civil, seja pelos contratos de alienação fiduciária em garantia.
 
Indo mais além, segundo Moraes,  a vedação da prisão civil, fora das hipóteses já admitidas pela CRFB, constitui direito fundamental criado por uma ordem superior universal, imutável e inderrogável, segundo a teoria jusnaturalista. 
 
A teoria jusnaturalista fundamenta os direitos humanos em uma ordem superior universal, imutável e inderrogável. Por essa teoria, os direitos humanos fundamentais não são criações dos legisladores, tribunais ou juristas e, consequentemente, não podem desaparecer da consciência dos homens.
 
Ainda segundo essa teoria, os direitos humanos fundamentais, em um país soberano, não podem retroceder jamais, nem mesmo com a ruptura da Constituição vigente, entendendo-se, dessa maneira, que ainda a Constituição de 1988 fosse substituída por outra, não poderiam ser abrangidas as hipóteses de cabimento de prisão civil.
 
Ante o exposto, conclui-se pela impossibilidade de utilização da prisão civil como medida coercitiva no cumprimento de sentenças que versem sobre obrigação de fazer e de não fazer. 
 
3. CONCLUSÃO
 
Por todo o exposto, pode-se concluir que as recentes alterações da legislação processual civil, em especial pelas leis n. 8952/94 e 10.444/02, ao art. 461 do CPC de 1973 e em vigência através do art. 497, do CPC de 2015, objeto do presente trabalho, configuram grandes avanços para a satisfação do credor em processos judiciais.
 
Com efeito, não mais existe necessidade de dois procedimentos, um para a certificação do direito (processo de conhecimento) e outro para a satisfação do credor (processo de execução), no âmbito do processo civil, haja vista ter sido encampada a ideia do processo sincrético, no qual se certifica o direito e se satisfaz o credor no mesmo rito.
 
Além do mais, para as obrigações de fazer, o art. 497 do CPC trouxe o princípio da primazia da tutela especifica ou do resultado prático equivalente, de modo que devem ser utilizadas pelo juiz medidas coercitivas e de apoio, tais como imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial, tudo visando à entrega do bem da vida devido ao credor.
 
Conforme referido no presente trabalho, a medida coercitiva, por excelência, é a multa, que exerce uma pressão psicológica sobre o vencido, para que cumpra a obrigação à qual foi condenado, da forma mais célere e eficaz possível. 
 
A demora na conclusão do processo é sempre prejudicial à parte que tem razão, e benéfico à quem não a tem. Assim, nada mais justo que o processo seja dotado de mecanismos capazes de dar eficácia, celeridade e justeza às decisões judiciais, devendo o processo civil evoluir cada vez mais nesse sentido. 
 
Deve haver, assim, a valorização do direito do credor em relação ao do devedor. Inúmeras são as garantias ao devedor em nome do devido processo legal, da segurança jurídica e do princípio da menor gravosidade, que são de extrema importância, mas o que não se pode perder de vista é que há um direito mais importante a ser tutelado, o do credor.
 
O credor deve ter assegurado o seu direito a uma justiça eficaz e à razoável duração do processo, direito este incluso entre os considerados fundamentais na Constituição.
 
Nesse sentido, não basta apenas o legislador criar institutos processuais novos que tenham por objetivo contribuir para a segurança jurídica de uma sociedade, que não deseja ver somente o seu direito declarado, mas também garantido e cumprido, de forma justa, célere e eficaz.
 
É necessário também que os operadores do direito – juízes, tribunais e advogados – apliquem diariamente tais institutos, de modo que possa ser modificada a cultura atualmente existente no pais, no sentido de que o devedor pode prolongar um processo judicial, sem dar cumprimento à obrigação devida, por vários e vários anos, ao seu bel prazer.
 
Daí a importância de maximizar o efeito coativo de todas as medidas permitidas pelo ordenamento jurídico, em especial das astreintes, com a sua exigibilidade imediata, atribuindo-se, desta forma, um maior grau de executividade paras as decisões judiciais, utilizando-se especialmente o mecanismo da penhora on line, previsto no art. 854 do CPC, para fazer cumprir o pagamento da multa por parte do devedor renitente. 
 
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Autor: Gerardo Veras
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